10/01/2000

Uma batalha invisível.

Estamos em confronto com a artilharia da N.E.I. Obi há algum tempo agora: nós mudamos de posição e eles tentam nos acompanhar com a linha de tiro. Quando tivemos a chance de fugir, o Capt. Klaas decidiu manter a distância, pois acredita que a N.E.I. terá, breve, problemas com combustível, e que a situação mudará em nosso favor. Não sei o que os canhões têm a ver com o díesel. Tão bem quanto podem ser operados por motores, suponho que possam ser desengrenados e operados manualmente de maneira quase tão rápida quanto.

Meu pensamento vai além desta batalha. O que Ivoire quer em nossa colônia? Se trouxe pólvora como Klaas supõe, para quê o fez? Até o armistício selar a batalha, Ivoire perdeu fronteiras, homens e artilharia, tendo o incarna de seu próprio território se voltado contra eles. Mansa Verne desfruta seus últimos anos de reinado sem a guia (ou as rédeas) do Hierofante Rudelger de Marena. Sua mão trêmula logo encontrará um tiro pelas costas que lhe coloque fora do caminho de um outro ministro sedento por poder. A nau encouraçada não poderia estar aqui em missão extra-oficial. Teoricamente, não poderia estar apontando os canhões para nós. Se estivéssemos ao alcance de um telégrafo ou dos sinais de rádio, este incidente daria a Oden permissão diplomática para virar Biblos de cabeça para baixo e fazê-la em pedaços, e eu tenho certeza que Nossa Dama Else o faria, e não pararia até que não restasse um pardo no mundo.

Por hora decido esperar, mesmo porque só vamos conseguir notificar a capital se encontrarmos uma nau aliada voltando para casa. Decidi não devolver mais os insultos proferidos a mim pelo Capt. Klaas, que provavelmente inveja minha tranqüilidade e meu porte, pois é jovem e inteligente, e nada mais poderia invejar neste velho escriba.

Para falar a verdade, a tensão neste navio está quase elétrica e eu vi o tal Dacre praticamente batendo a cabeça nas paredes enquanto esperava novas ordens do capitão. Espero que não tentemos abrir fogo contra os ivoreanos, pois até os leigos como eu sabemos que as N.E.I., principalmente as construídas em Hevelius como esta, suportariam em suas blindagens um tiro até quatro vezes maior do que o nosso maior canhão, o Hitkill 72 posicionado a bombordo (por algum motivo, o Capt. Klaas prefere combater à esquerda. Deve ser canhoto). Apesar disso, o Barão de Feidhelm insiste em tentar um tiro parabólico contra o casário do navio inimigo (o casário é a estrutura onde se abriga a tripulação). Espero que o capt. não dê permissão para ele fazer isso, pois em fúria é capaz de que os ivoreanos abram fogo contra os asteróides e sejamos abalroados pelos fragmentos.

Acho que, na empolgação, ele não está considerando que as rápidas manobras às quais está submetendo o motor do nosso navio estão consumindo nosso diesel em grande velocidade. É possível que, quando isso terminar, tenhamos que prosseguir contando com o éter favorável, o que comprovadamente não é comum ao redor de Calibur, na verdade muito pelo contrário, e são muito poucos os planinautas que conseguem surfar uma crista de onda etérica em velocidade suficiente para perfurar uma redoma, ainda mais uma redoma virginal como a de Calibur.

É possível que o excelente capt. conte com o conhecimento de Ólafur para realizar esta manobra. Não é a primeira viagem de que ele participa e, ativamente, ele aprende rápido e está sendo muito mais útil do que nossos marujos, que receberam treinamento em Tércia. Reage bem a ordens e toma decisões independentes com rapidez (o que é muito importante). Entende praticamente tudo que falamos e consegue se comunicar conosco com razoável eficácia, apesar de pronunciar as vogais de maneira explosiva e praticamente não conseguir ligar quaisquer duas letras com um 'S'. Ele ainda supera isso.

Como eu estou discorrendo sobre o sotaque de Ólafur neste momento eu não sei. Só não me jogo convés abaixo porque já estive em uma situação muito semelhante em 712 D.F., ainda durante a guerra, quando nosso navio foi interceptado por quatro N.E.I.s (se eu não me engano, Tira, Tira-3, Alcadon e Yansar).

Ec. Liam Guerino de Delfina